“NIPA MÓWÀ’KAN” – MITO DO PRIMEIRO ONÍYÀWÓ.



Contam os nagôs igbominas (ìgbómìnàs) em solo brasileiro, que após o fechamento do portal, que separava o planeta Terra (àiyé) do infinito (Sánmà) “Oxênibuomi” (Ose n’ibú omi – Ọ̀ṣun nas profundezas das águas dos rios) recebeu de Olodumarê (Olódùmarè) a incumbência de escolher entre os seres humanos, o mais forte, o mais virtuoso e inteligente dos homens, ser este, que deveria ser investido na função de sacerdote (aborè).
Destacou-se entre eles o belo e intrépido jovem que atendia pelo nome de Nipamóuacam (Nipa mówà’kan – Aquele que é capaz de compreender e vascular os corações). Tão logo fora feita a escolha, Oxum (Ọ̀ṣun) providenciou para que o escolhido adquiriu-se todos os conhecimentos necessários a pratica da liturgia e suas ritualísticas.
Alguns anos depois, Oxum foi comunicada que o Irunmólé Icú (Ìrúnmólè Ìkú) viria buscar Nipamóuacam apesar dele ainda ser jovem. Desesperada Oxum recorre a Orunmilá (Òrunmìlà) na tentativa de afastar do seu sacerdote a terrível sina que se aproximava. Foi com pesar que Orunmilá reportou-se a Oxum dizendo: ‘O que pedes é impossível. A determinação de Olodumarê diz que: Os seres humanos voltarão ao pó de onde vieram, suas almas retornarão ao infinito para prestarem contas dos seus atos. Sei que este jovem é teu protegido e que tu o amas também apesar da proibição. Desejo carnal esse, que a motivou retardar a ordenação sacerdotal do mesmo até a data. Infelizmente, o Icú – O Senhor dos Mortos virá buscá-lo no momento exato determinado pelo seu destino’.
Desesperada Oxum suplica: ‘Orunmilá, poupe a mim e a todos os que são inteiramente seres humanos desta triste tragédia. Ajude-me a transformar o grande amor da minha vida num ser que possa voltar ao planeta Terra após a morte, mesmo que seja somente em espírito’. Orunmilá disse-lhe: ‘Retornes daqui a quatro dias minha filha, irei interceder por ti e por todos junto a Olodumarê’. Transcorrido os quatro dias, Oxum ainda em desespero retorna a Orunmilá na expectativa da solução do impasse da morte de Nipamóuacam.
Diante de Orunmilá, Oxum em prantos se ajoelha e suplica: ‘Então, meu pai, conseguistes junto a Olodumarê uma solução, uma trégua, enfim, responde-me, por favor?’ Orunmilá, olhando carinhosamente para Oxum, pronuncia-se: ‘Levanta-te minha filha, Olodumarê, nosso Deus e Senhor foi benevolente para contigo e para com os habitantes da terra (ará-àiyé). Será criada uma morte aparente para Nipamóuacam (Nipa mówà’kan), entretanto, para que tal fato se concretize, tu que és semimortal deverás providenciar em grande estilo a purificação e consagração do teu sacerdote. Deverás proceder de acordo com os ritos determinados afins de que o corpo de Nipamóuacam, após a morte, seja transformado numa ave, animal este, que será absoluto, insubstituível e único nas iniciações e consagrações dos futuros neófitos. Será também, a partir desta data, o símbolo da união dos homens com os ancestrais deificados (ẹbọra).
Oxum preparou imediatamente o local da iniciação e consagração de conformidade com as normas e ritos que lhe foram transcritas, transformando Nipamóuacam no primeiro altar vivo da nossa religião. No dia seguinte da iniciação e consagração, tão logo os primeiros raios de sol surgiram no Leste anunciando a presença do Criador, Oxum apresentou Nipamóuacam aos quatro cantos de adoração do universo, e ao ser colocado no centro do local onde fora consagrado, sobrevoou no infinito o pássaro Ogomugomu (pássaro de rara beleza não existe similar no Brasil) que, ao pousar sobre a cabeça de Nipamóuacam, salpicou-o totalmente com um pó de cor branca (ẹfun).
Pouco tempo depois, conforme havia sido previsto, Ìkú – Senhor dos Mortos devolveu a terra o corpo de Nipamóuacam e o seu espírito foi levado à presença de Elérin Ipim (Elérin Ìpin – A Testemunha do destino) no Ilê-éjó Ocam (Ilé-Ejó Okan – Tribunal das Almas) para prestar contas dos seus atos na Terra. O local onde o sacerdote foi enterrado conforme determinação de Oxenibúomi (Ose n’ibú omi) transformou-se num pequeno bosque sagrado e pouco tempo depois, neste mesmo local, surgiu uma ave de penas negras, mescladas com pintas brancas, possuindo a parte superior da cabeça azulada e sem penas, e no centro da mesma, um cone formado pela sua própria estrutura. Esta ave recebeu dos nagôs iorubas o nome de Étú (Ẹtù’ – galinha d’angola).
Esclarecimentos: O mito acima narrado elucida a obrigatoriedade da “Ẹtù” (galinha d’angola) em toda iniciação e consagração dos neófitos da Religião dos Orixás (ioruba), uma vez que a aludida ave é absoluta, insubstituível é única na sagração dos omoerrin (omo-ehin – aprendiz, noviço) que são os oniiawô (oníyàwó – esposo, noivo, recém-casado) e as iiauô (ìyáwó – esposa, noiva, recém-casada) dos orixás e ancestres deificados. Tal obrigatoriedade e ratificado em um ditado ioruba que diz:
“Ko si Ẹtù, ko si múwolé”. (Co si étú, co si muuólê)
“Se não houver galinha d’angola, não há iniciação”.

BIBLIOGRAFIA: PENNA, Antonio dos Santos, Mérìndilogun Kawrí – Os Dezesseis Búzios. Páginas 31 e 32 – Produção Independente: RJ, 2001 – Ano 2001.

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